A primeira lição que um jovem estudante de Direito deve entender, quando ingressa no curso, é aquela que nos explica estarmos todos inseridos num mundo de normas. A normatividade exerce a primorosa função de conter os ímpetos, os instintos e os desejos da Sociedade, simplesmente porque pressupõe uma organização prévia à inserção do indivíduo na teia. A causalidade, quer dizer, a simples busca pela origem desse padrão pode ser alcançada através da compreensão do papel das famílias, pois esse parece ser o berço de onde surgiu a padronização de condutas e comportamentos.
De fato, a normatividade nada mais é do que a interferência de um comando na conduta do indivíduo, ou uma orientação que gera uma expectativa sobre qual a melhor maneira de organizar um convívio entre duas ou mais pessoas. Na realidade, essa dupla característica da normatividade - prescrição / descrição -- inicia-se em processos tão elementares como indispensáveis à estabilidade da associação entre pessoas; a linguagem, por exemplo, representa um corpo normativo espetacular, e, talvez, primordial, a gerenciar a interação social -- é a mais elementar das trocas humanas, na qual a estrutura básica emissor-receptor necessita de uma padronização para que a mensagem seja entendida e o resultado seja uma comunicação de sucesso entre dois cérebros. A fala, portanto, é o primeiro elo dessa cadeia normativa tão complexa na qual estamos inseridos.

Diante da exposição efetuada no parágrafo anterior, podemos ver que foi seguido um escalonamento que não incluiu a força como um dos elementos subjacentes ao cumprimento das normas. Por que? Simplesmente porque a força não é um critério inerente à normatividade, mas um pressuposto anterior ao surgimento da norma. Talvez seja essa uma das maiores confusões dos teóricos, ao longo dos séculos que, tentando explicar o fenômeno normativo, incluíram na estrutura normativa as ideias de coerção e coação.
A coerção, aqui entendida como o temor que leva o indivíduo a cumprir o conteúdo da norma -- quer seja ele prescritivo, quer seja descritivo --, nada mais é do que uma reação do indivíduo ao objeto-norma; reação individual que pode não chegar a se constituir diante da norma, haja vista que ela poderá ser recepcionada por completo, sem gerar no ser o medo necessário ao cumprimento do que foi pré-estabelecido, como é o caso da aceitação oriunda da confiança. Assim, a coerção pode ou não existir, e o que não está presente, mas antes é apenas uma possibilidade, não é concreto e não pode ser algo constituinte do real.
A coação, que seria a utilização ou da força física, ou da psíquica, ou de ambas, também não integra a ideia de norma, pois é uma condicionante externa da convivência social: é um dado natural, também exógeno ao conceito de norma. Na realidade, a norma existe para que o ser humano não se utilize da força para exigir um determinado tipo de conduta -- mas isso também não impede que a norma contenha uma autorização para o seu emprego, tanto que se tem, no Direito, o cumprimento forçado da sanção, como forma de demonstrar a obrigatoriedade da norma àqueles que simplesmente não aderiram espontaneamente ao seu cumprimento, fazendo-se valer o conteúdo normativo por meio da violência institucionalizada.
Portanto, o entendimento aqui exposto é o de que vivemos num mundo normatizado para que não nos utilizemos da violência para garantir qualquer ordem ou organização social. Deve-se pensar na norma como um instrumento, uma ferramenta à disposição dos processos de interação social. Porém, se as normas são utilizadas com o objetivo de garantir a opressão de uns sobre os outros -- que é o que tem sido feito desde sempre --, aí não se trata de uma questão relacionada à estrutura das normas, mas diretamente ligado ao uso que os seres humanos fazem dos objetos e coisas que cria.
2 comentários:
Praxas, lembrei perfeitamente do meu primeiro semestre de Direito e de suas aulas (primeiras palavras: [...] vocês não vão atravessar paredes ou levantar carros, mas podem fazer grande diferença na sociedade se entenderem a origem e aplicação das normas [...] - Antônio Torquilho Praxedes - 2010.1 K37 - UNIFOR). Em relação ao uso da força na criação das normas, como elemento que a antecede, pode fazer algum comentário sobre essa FORÇA e as NORMAS antes da "democracia" atual? Abraço, Rodrigo Fontenele.
Rodrigo, eu elaborei este pequeno fragmento, para tentar responder à sua pergunta: http://lobofrontal.blogspot.com/2013/02/direito-e-forca.html.
Espero que você goste.
Abraços.
A.T.P.
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